Emiadê /

Tardes quentes do verão de 2013

Emiadê e sua prima Kelly. São Vicente/SP, em meados de 2007.

 

Um garoto negro, da periferia, que morava numa casa dos fundos, em frente ao paredão do cemitério municipal. Em sua área de serviço/entrada de casa, no meio das roupas estendidas no varal, um ventilador, mini alto falante tocando Elis Regina, Chico Buarque, Gonzaguinha, Nana Caymmi, Tulipa Ruiz… e um espelho. Lá estava ele, performando sua infância, aos 14 anos, já fazia aula de música e teatro. Gostava de dublar as músicas, dançar, experimentar corpóreo-vocalmente as sonoridades ao mesmo tempo em que se analisa pelo reflexo do espelho.

Ele para, aguardando a próxima faixa, tentando imprimir as sensações pela expressão facial e corporal. Gostava de dublar, do seu jeito afeminado e descontraído.

A câmera em que o registra não o atrapalha, nesses 50min de registro audiovisual ainda conversa comigo, dos seus gostos, das faixas que não curtiu, mostra os seus trejeitos , giros, muitos braços. Fala pra mim que adora a interpretação da Elis Regina na música “Cartomante”. No dia das crianças desse mesmo ano, ele recebeu de presente da mãe uma maleta de pincéis de maquiagem, para suas experimentações com maquiagens que foram compradas no 1,99. Pega uma cadeira, senta-se em frente ao espelho e ao som das faixas musicais começa seu processo.

…experimenta personagens de frente ao espelho, risos, gargalhadas, caras e bocas.

Emiadê, São Vicente/SP, tempos natalinos, em meados de 2007.

Ele também tenciona suas filosofias de vida, que todo ser humano tem duas caras – uma feliz e outra triste. Pega um tecido branco, coloca em sua cabeça, para representar seus cabelos longos, o panteia, experimenta personagens de frente ao espelho, risos, gargalhadas, caras e bocas. Depois vai atrás da touca de crochê feita pela vizinha que morava na casa da frente, experimenta formas de colocar na cabeça, experimenta caras e bocas, muda novamente o jeito da touca na cabeça. Coloca um brinco de pressão em uma das orelhas e o aprecia frente ao reflexo do espelho.

Toda a sua fantasia termina com sua avó o chamando e pedindo para abaixar o volume do mini alto-falante, se desmonta, desliga o som e todo aquele universo criado se acaba, assim como o vídeo-registro dessa tarde quente de 2013.