Malu Teodoro /

álbum de família: caos inicial

tenho escrito tanto. tenho buscado sentidos em palavras.

entretanto escrever o primeiro post nesse canal tem sido difícil. as palavras não firmam. não pousam.

“pôr as tripas no papel”: me sugere uma amiga citando glória anzaldua. “escrever como quem diz ‘eu estou viva'”, diz outra, mencionando francisco mallmann.

(…)

 

o projeto que propus ao lab cultural envolve transformar um álbum de família em um audiovisual. o álbum de família que fiz sobre o primeiro ano de minha filha, ou sobre meu primeiro ano como mãe. o projeto mais longo que já trabalhei. minha filha já tem 3 e meio.

me pergunto o que é que me custa tanto nesse trabalho e porque seguir com ele, já que me custa tanto. percebo que esse período da minha vida envolveu muito desamparo, solidão e abandono. essa semana, pela primeira vez, consegui olhar para esse período nomeando essas palavras. importante que sejam ditas.

enquanto construía álbum, nas pequenas brechas que tinha entre o trabalho do cuidado ou em sacrifício das raras noites de sono, eu sentia que aquele ato me colocava de volta num espaço de elaboração de mim mesma, intimamente me afirmava como pessoa que cria coisas, além de crianças. ter me tornado mãe me fez artista. e mais ainda, o álbum me fez não sucumbir enquanto artista, mulher, ou o que quer que seja que eu estava ali desesperada por não deixar morrer.

estava desesperada por dar sentido àquela história que hoje vejo lustrada por mentiras, machismo, desrespeito, apagamentos, etc.. mas na época em que o elaborava, era outra ideia que me fazia seguir. olhar para uma situação traumática do passado com olhos compassivos. tudo faz parte da mesma história de quem sou. apesar das mentiras, em alguma parte do álbum escrevo: é sobre mim e sobre minha filha. verdade.

glória – solange – maria – inaê

uma avó que aos 40 morreu do coração por desgosto. uma mãe que aos 20 fechou o coração por dor e medo. ninguém nasce de um coração encerrado.

são muitas questões em torno de um álbum como são muitas questões em torno de uma vida. em meu caderno de processos encontro essa anotação: não existe relação com o outro que não seja fatal. uma relação de família, com muitos outros, só pode ser uma fatalidade. e a proposta de ricardo (aleixo) pro lab: onde não há pecado nem perdão.

(…)

algumas leituras que acompanharam o processo, até aqui:

o álbum do estranhamento familiar na fotografia de ilana bar. ilana bar & laura erber. em: https://revistazum.com.br/galeria/ilana-bar-album-familiar/

álbum de família e a imagem e nós mesmos, de armando silva. editora senac/sp.

álbum de família, morte e vida na cultura Bantu, douglas da silva e rodrigo lopes em negritude infinita: o cinema é negro. ed. casamata. em: https://ateliecasamata.files.wordpress.com/2021/09/negritude-infinita-_24052021.pdf

e algumas páginas soltas: