Resumo do processo corporal
Quem é que guia?
Quem é guiado?
Esse é o resultado do experimento cênico que construí aqui. Mas a pesquisa continua.
Sempre gostei de brincar com terra e andar descalça sentir o chão, sentir mesmo, abrir os dedos do pé, rola no chão. Isso era toda tarde de todo dia.
Até lembro de sai correndo descalça para brinca no terreiro perto do barranco de terra, sem olhar pisei num prego.
Como doeu, mas doeu mais fica sem brincar na terra.
E fala pouco me fez aprender a ouvir um monte.
Hora de tomar café da tarde sempre sagrada, se a vó chamasse pra tomar café tinha que ir, não podia fazer desfeita. E tomar café é como um abraço.
E minha vó nesses momentos de café, ela contava sempre as mesmas historias
Sempre as mesmas historias
Sempre as mesmas histórias
E todo dia a mesma historia
E todo dia mesma história
Como um refrão, ou um disco que não para de toca.
Eu ouvia sempre como se fosse a primeira vez.
Era meu jeito de abraça de volta, pra agradecer o café.
Não é só tomar café, tinha época, só por um tempo, que a gente catava o café do pé no fundo do terreiro, colocava pra secar, torrava o café e moía o café, passava e tomava café. Isso se repedia o mês todo, pra chega no café do copo de todo dia.
Catava o café do pé no fundo do terreiro, colocava pra secar, torrava o café e moía o café, passava e tomava café
Catava o café do pé no fundo do terreiro, colocava pra secar, torrava o café e moía o café, passava e tomava café catava o café do pé no fundo do terreiro, colocava pra secar, torrava o café e moía o café, passava e tomava café.
Esse café tinha gosto de carinho e proteção, o mesmo gosto que eu imaginava se a gente tivesse se abraçado de verdade.
E quem diria que esse disco pararia de toca.
Escolhi ou fui escolhida pela roda, esse grande ciclo da vida todo dia a mesma historia
Todo dia a mesma historia
E cada dia um dia diferente
Todas as mulheres, daqui de casa, tem o mesmo ciclo, como se sempre contasse a mesma história, a mesma vida, mas história diferente. Tentando fugir da mesma história, me guiar, escolhi o circo, Mas é sempre a mesma história.
O que me chama a atenção no circo é o quanto se pode se expressar sem falar uma palavra, eu acho fascinante, como disse não gosto muito de falar.
Eu fui escolhida pela roda, passei por todos os aparelhos possíveis e disponíveis, mas basto ver uma vez uma mulher fazendo o Roue cyr, que eu me apaixonei, e me senti capaz.
Capaz de dominar esse aro de ferro pesado, mas que mesmo assim parece flutuar no chão, sentir o chão e sentir a roda de ferro ao mesmo tempo, e trabalhar uma harmonia perfeita, equilíbrio e força entre a roda de fero o chão e eu.
Passava dias no início, a semana toda
Girava e caia no chão
Girava e caia no chão
Girava e caia no chão
Girava e caia…
E tudo foi se encaixando, meu corpo com a roda, escolher em qual chão devo pisar e roda é fundamental. Na verdade, ficamos intima eu e a roda. A gente se entende. Ora ela que me leva para onde ela quer ir, e eu deixo, ora eu que escolho os caminhos que fazemos girando juntas. Quase não se sabe quem guia e quem é guiado.
Quem é que guia?
Quem é guiado?
A roda escolheu até fazer parte do meu corpo. Assim como meus ancestrais vieram fazer as minas de ouro aqui em minas. Cavando uma estrutura circular e em zig zag, para as minas n desabarem eu tenho uma estrutura circular no meu olho esquerdo de aço cirúrgico que segura minha córnea pra ela n desabar.
Quando estou com a roda é que nem toma café, como se fosse um abraço.
Minha mãe, Dona Jeiza, que carinhosamente me chama de Nunika, ela e toda família. Me conta sempre a mesmas histórias. As que sempre conta é que nasci de 5 meses e pra não morre ela fez promessa pra Nossa Senhora. Conta também do dia que me escondi no armário e ela ficou me procurando. A que mais gosto, é que festa do rosário, eu com uns 6 anos, fizemos uma peça, simulando os pescadores encontrando Nossa Senhora Aparecida, e me deixaram escondida em segredo do público, pra quando o pescador entrasse segurando uma imagem, eu saia vestida de Nossa Senhora, como surpresa. E foi um catasse, os tambores começaram a tocar e a festa começar.
Sempre a mesma história,
Sempre a mesma historia
E minha mãe pede pra passa um café e vai contando as mesmas historias
Eu no mesmo ciclo pra retribuir o abraço escuto como se fosse a primeira vez.