11 de setembro de 2023

Atabaque – Fazer um tambor é refazer

Entre as ripas de madeira de um atabaque, corpo de frestas, vejo histórias muito antigas. Vejo também no pensamento outras ngomas, ingonos, outras gomas -tambores que guardam semelhante forma bojuda, trazidas de África ou nascidas indígenas, ocadas em tronco maciço. Lembro que muitos deles desapareceram – destruídos ou saqueados pelas polícias – ou pairam em vitrines como peças silenciosas nos museus. Tambaque, tabaque (termos utilizados ao longo de nossa história colonial para designar diversos tambores membranofônicos, mas que se conforma -ao que tudo indica- a um tipo específico de tambor por volta do final do séc.XIX) por sua vez, não é tronco de madeira ocada mas, antes, fruto da escassez deste material no contexto urbano e da imensa criatividade dos povos negros em meio à um contexto escravista na diáspora. Reinvenção, o atabaque nasce da barrica, nasce do refugo ou descarte, da aprendizagem da tanoaria para dar-lhe as formas ideais aos muitos contextos em que está presente. E da barrica também os tambús, algumas puítas ou ilús, ali em Cuba as congas, no Uruguai tambores do Candombe, outros tantos.

Fragmentos do se lê na pintura acima: “Barrica: recipiente oco feito de varas (duelas) de madeira, ligadas por aros de metal – utilizado para armazenar mercadorias, especialmente líquidos. Técnica de fabricação de barris: tanoaria. Tambores barricas na diáspora afroamericana:atabaques, tambores de candombe, congas. “cálculo según el molde la cantidad de duelas que voy a usar, los tambores tienen que tener determinada medida en su boca, determinada medida en su panza, y otra en su culata. Son tres medidas distintas en un unico instrumento, redondo, pero curvo también (…) Eso lleva determinada tarea em serie con unos trabajos que nosotros, particularmente, lo sacamos del oficio del tonelero, de hay es que nosotros pudimos retomar nuestra cultura”(…)”son, originalmente, ‘tambores de candela’, que han de ser templados a la llama reiteradas veces.”

Inicio o processo de laboratório criativo a partir das tipologias dos atabaques. Parto dos seus processos de construção para elaboração de objetos e desenhos que evoquem a memória de outros tambores-parentes, histórias ao seu redor e também modos de fazer. Pretendo ampliar, ao longo da pesquisa, o universo de tambores e formas serem abordadas. Em tudo está a mão: fazer um tambor è refazê-lo, é fazer de novo uma sequencia de processos, repetir (sempre igual, sempre diferente) uma forma, um amarre, é o antepassado-presente no gesto, é continuidade e criação.. A mão que fabrica e toca, repete para lembrar, repete para presentificar – para transformar conservando uma essência, como a síntese rítmica das claves que atravessa tempos e territórios. Cantigas, palavras, sons que se transmitem e perduram, conservando/ ampliando sentidos fundamentais.

Na imagem acima, um exercício de planificar dois tipos de nós de tambores com afinação por cavilhas ou birros. Uma delas, aplicada em diversos tipos de tambores africanos, em principal na região da costa oeste do continente. Outra, comum entre os atabaques de birro. Feitos, neste objeto, com uma só corda interligando os dois processos. Um suporte de madeira rachado ao meio e que se sustenta por meio dos nós. Conservar a forma.