REVISTA nº 3

Capa

Isael e Sueli Maxakali

Vivendo às margens do Rio Mucuri, em Minas Gerais, Isael Maxakali venceu um dos mais importantes prêmios de artes visuais do país, o Prêmio PIPA, e sua trajetória com sua companheira Sueli e com o povo da Aldeia Nova Maxakali nos contam sobre a luta e a arte contemporânea indígena

Paula Berbert, Roberto Romero
04 Nov 2020 15 Min
Isael e Sueli Maxakali
Sem título (2005). Aquarela de Sueli Maxakali

No início dos anos 1990, a Terra Indígena Maxakali encontrava-se dividida por um corredor de fazendas entre as aldeias de Água Boa (Santa Helena de Minas, MG) e Pradinho (Bertópolis, MG). Situada no Vale do Mucuri, nordeste de Minas Gerais, quase na fronteira com a Bahia, aquela terra tinha sido o último refúgio para os sobreviventes de mais de dois séculos de perseguições, epidemias e massacres, resultado do avanço da frente colonizadora sobre aquele vale. Àquela altura, a exuberante Mata Atlântica que assombrava os viajantes europeus que passaram por ali no início do século XIX encontrava-se então praticamente toda convertida em pasto para a criação de gado, atividade predominante ainda hoje na região. A pequena terra onde foram “cercados”, como costumam dizer os Tikmũ’ũn [+]Os Maxakali se autodenominam Tikmũ’ũn e somam atualmente cerca de 2.400 pessoas. Vivem em cinco territórios diferentes, no nordeste do estado de Minas Gerais, nos municípios de Santa Helena de Minas, Bertópolis, Teófilo Otoni e Ladainha. A língua falada em suas aldeias é o Maxakali, do tronco linguístico Macro-Jê. [-], seria ainda destrinchada e dividida entre antigos funcionários do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e, mais tarde, da própria Fundação Nacional do Índio (Funai), comandada por chefes de polícia durante a ditadura militar (1964-1988). Parte dessas terras seriam ainda vendidas a terceiros pelos mesmos funcionários, dando origem a uma disputa fundiária entre indígenas e fazendeiros que se arrasta até os dias atuais.

Foi ali, nas margens do córrego Água Boa, onde nasceram e cresceram Sueli e Isael Maxakali. Filhos de importantes lideranças políticas e espirituais de seu povo, aprenderam desde cedo os cantos e histórias dos yãmĩyxop, uma legião de povos-espíritos da floresta que, de tempos em tempos, deixam suas terras distantes para visitar os Tikmũ’ũn em suas aldeias.

Sueli e Isael Maxakali durante a festa do Dia do Índio em Aldeia Verde, abril/2014. Foto: Charles Bicalho

Esses seres que traduzimos como “povos-espíritos” são multidão e podem se apresentar sob aspectos diversos: minúsculos e invisíveis nos corpos ou cabelos dos Tikmũ’ũn, materializados nos cantos que entoam na kuxex (casa dos cantos) ou ainda sob os corpos magníficos, coloridos e mascarados que saem no pátio das aldeias para buscar comida, cantar, dançar e curar. Mas os yãmĩyxop são igualmente o próprio evento, os cantos, as danças ou os “rituais”, como também os chamamos. A eles, os Tikmũ’ũn dedicam quase diariamente boa parte do seu tempo, seja preparando o que lhes oferecer de comer e dançando em sua companhia no pátio, como fazem as mulheres, ou recebendo-os na kuxex, cantando e caçando com eles, como fazem os homens.

Pouco depois de se casar com Sueli, em 1993, Isael assumiu a casa dos cantos (kuxex) do seu avô, o importante pajé Otávio, falecido naquele mesmo ano. Trata-se de um importante marco na vida do jovem casal, que passaria dali adiante a cumprir diversas responsabilidades em relação à realização dos rituais. Esse é também o período de uma importante luta travada pelos homens e mulheres Tikmũ’ũn pela unificação da sua terra e pela desintrusão dos fazendeiros que impediam o livre trânsito entre as áreas de Pradinho e Água Boa. Com o apoio do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), do Centro de Documentação Eloy Ferreira (CEDEFES), além da ONG internacional DKA-Austria, os Tikmũ’ũn finalmente conseguiram a unificação dos territórios, em 1996. Apesar dessa importante vitória, a nova demarcação não considerou o território de ocupação tradicional, tal como os Tikmũ’ũn o reconhecem. As violações de direitos e o esbulho de suas terras tradicionais perpetrados pelos antigos servidores do SPI e Funai jamais foram reconhecidas ou reparadas pelo Estado brasileiro e, apesar dos reiterados apelos pela ampliação de suas terras, nenhum processo formal de reconhecimento e delimitação foi instaurado nos últimos anos. É nesse contexto que Sueli e Isael, desde muito jovens, aprenderam a lutar pelos direitos do seu povo à terra e ao seu modo de vida tradicional.

Multiplicando linguagens

Com a redemocratização do país e o fortalecimento dos direitos indígenas garantidos pela nova Constituição, iniciam-se experiências pioneiras no estado de Minas Gerais de criação de escolas indígenas nas aldeias e de formação de professores indígenas nas universidades. É também o momento em que novas ferramentas de registro audiovisual, como câmeras e gravadores portáteis, tornam-se mais acessíveis e populares, permitindo a formação dos primeiros cineastas indígenas no país, sobretudo a partir do projeto Vídeo nas Aldeias (VNA). É nesse período que Isael e Sueli passam a frequentar Belo Horizonte para participarem de eventos na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e entram em contato com os primeiros filmes realizados por parentes de outras etnias. Em 2004, durante uma oficina ministrada pelo cineasta indígena Divino Tserewahú no festival forumdoc.bh [+]Festival do Filme Documentário e Etnográfico de Belo Horizonte. Criado em 1997, o festival é uma das principais janelas para o cinema indígena contemporâneo e está em sua 24ª edição. [-], Isael tem sua primeira experiência de realização audiovisual.

A partir daí, decide que iria fazer os próprios filmes, sempre junto da esposa Sueli, para dar a conhecer a cultura do seu povo, a beleza dos cantos, histórias e rituais yãmĩyxop.

Desde então, o casal não parou mais. Em 2007, com uma câmera emprestada pela pesquisadora Rosângela de Tugny, Isael filmou o ritual de iniciação dos meninos, o Tatakox, título do seu primeiro filme. As imagens registradas em uma fita mini-DV foram entregues para a antropóloga e cineasta Renata Otto Diniz, em Belo Horizonte, que relembra sua primeira reação ao assisti-las na época:

“No momento em que vi pela primeira vez o material filmado, só pude admirar sua forma arrebatadora. Editamos quase sem cortes, acrescentamos letreiros e o levamos para os curadores do forumdoc.bh.2007. O filme foi exibido numa sessão especial do festival. Uma vez exibido, o júri daquele ano decidiu unanimemente inventar e conceder ao filme o Prêmio Glauber Rocha, reconhecendo nele sua excepcionalidade! Com Tatakox, Isael inaugurou sua maneira de filmar, estreou sua carreira de cineasta e não parou mais de fazer filmes.”

O registro de Tatakox coincide com a criação, naquele mesmo ano, da Aldeia Verde, para onde dezenas de famílias Tikmũ’ũn haviam se mudado após quase dois anos de espera, desde que tiveram que sair às pressas de uma terra vizinha à aldeia de Água Boa devido a eclosão de graves conflitos. Aquele era também o primeiro ano de Isael como aluno do recém-criado Curso de Formação de Educadores Indígenas na UFMG, o FIEI-Prolind, pelo qual se graduou em 2011. Embora não fosse formalmente aluna do curso, Sueli o acompanhava em todas as suas temporadas em Belo Horizonte durante os anos de formação. Juntos, eles organizaram o livro Hitupmã’ax: curar (Literaterras, 2008), apresentado como trabalho de conclusão de curso no FIEI. Foi no processo de produção dessa publicação que Isael e Sueli iniciaram sua pesquisa com o desenho e pintura em papel, em que se destacam suas belíssimas aquarelas com imagens dos yãmĩyxop, de rituais e práticas de cura que acompanham o livro como ilustrações.

Sem título (2005). Aquarela de Sueli Maxakali

Quando a filha mais velha do casal, Jupira Maxakali, estava prestes a ganhar o primeiro filho, Isael e Sueli tomaram a iniciativa de registrar o ritual que marca o “fim do resguardo”, Yiax Ka’ax, título do seu segundo média-metragem. Em 2008, o casal ajudou a fundar, com o pesquisador Charles Bicalho, a produtora Pajé Filmes, através da qual realizaram uma série de curtas-metragens, entre eles Xokxop pet (2009), Xupapoynãg (2011), Kotkuphi (2011), Yãmiy (2011) e Mîmãnãm (2011).  Todas essas experiências iniciais confirmariam um dos traços mais importantes da produção fílmica da dupla: o interesse em registrar os rituais de passagem dos espíritos yãmĩyxop pelas aldeias. Como escreveu o pesquisador de cinema André Brasil: “Mais do que registrar práticas culturais e ritualísticas, os filmes parecem integrar, ainda que lateralmente, o sistema xamânico Tikmũ’ũn, participando de seus protocolos, de suas relações e de suas virtualidades.” [+]BRASIL, André. “Caçando capivara: com o cinema-morcego dos Tikmũ’ũn”. Revista Eco-Pós, v.19, n.2, 2016. [-] De fato, para o casal, a experiência de filmar coincide com a própria participação no ritual:

“Pra mim, quando eu pego a câmera, eu passo pros movimentos dos rituais, da dança. E, pra mim, eu tô participando também, tô dançando… A gente esquece da câmera, aí parece que tá no meio da brincadeira. Correndo, filmando, é assim”, explica Isael.

Tatakox yîm xax xeka / Tatakox tem braço forte (2005). Aquarela de Isael Maxakali

Desde então, Sueli e Isael produziram uma série de longas-metragens, a maioria em parcerias com realizadores não-indígenas, que resultaram em diferentes experimentos com a linguagem e o fazer cinematográficos. Com Renata Otto Diniz, lançaram Quando os yãmiy vêm dançar conosco (2011), resultado da primeira oficina de audiovisual realizada na Aldeia Verde. Em 2015, Isael lança Kakxop pit hãmkoxuk xop te yũmũgãhã: a iniciação dos filhos dos espíritos da terra (2015), outro longa-metragem sobre o Tatakox, ritual de iniciação dos meninos. [+]Depois que Isael lançou o primeiro Tatakox, em 2007, cineastas da aldeia Vila Nova (território do Pradinho na Terra Indígena Maxakali) realizaram um filme sobre esse mesmo ritual, o Tatakox Vila Nova (2009), explicitando a forma própria dos pajés desta comunidade de conduzir esse rito. O média-metragem produzido pelos parentes do Pradinho estimulou Isael a realizar um novo filme sobre esse ritual, Kakxop pit hãmkoxuk xop te yũmũgãhã: a iniciação dos filhos dos espíritos da terra (2015), de modo que essas três produções podem ser compreendidas como um diálogo entre xamãs e cineastas Tikmu’un, em que cada um dos filmes reverbera no outro, sublinhando as variações das práticas xamânicas e audiovisuais.]. Em 2016, junto ao cineasta Roney Freitas, produz Grin [+ O documentário foi selecionado para participar da 21ª Bienal de Arte Contemporânea Sesc Videobrasil e foi premiado com a menção honrosa. [-], filme que revisita as memórias dos Tikmũ’ũn sobre o período da ditadura militar e as experiências da Guarda Rural Indígena e do Reformatório Krenak. No mesmo ano, Isael lançou ainda sua primeira animação, Konãgxeka: o dilúvio maxakali (2016), um curta que trata de uma das narrativas míticas Tikmũ’ũn sobre o fim do mundo, em mais uma parceria com Charles Bicalho e a Pajé Filmes. Em 2019, lançaram o elogiado Yãmiyhex: as mulheres-espírito, premiado na 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes. Atualmente, finalizam o próximo filme, Nũhũ yãg mũ yõg hãm: essa terra é nossa!, fruto de uma parceria com Carolina Canguçu e Roberto Romero, no qual revisitam as moradas de seus ancestrais, nos arredores da terra atualmente demarcada.

Esse período em que a produção cinematográfica de Sueli e Isael se intensificou foi marcado também pelas primeiras participações em exposições. Isso aconteceu nas proposições que se desdobraram do projeto Imagem-corpo-verdade, que contou com uma mostra de fotografias, em que os trabalhos de Sueli ocuparam um lugar de destaque, e com a exposição etnográfica Cantobrilho Tikmũ’ũn… no limite do país fértil, ambas organizadas por Rosângela de Tugny. Tais iniciativas passaram, em 2010, pelo Museu do Índio do Rio de Janeiro, e depois pelo Museu de Artes e Ofícios de Belo Horizonte, em 2011. Em 2015, Sueli participou da exposição No Caminho da Miçanga, apresentando uma releitura de uma máscara mortuária egípcia. A partir das experiências adquiridas nesse projeto, organizado pela antropóloga Els Lagrou no Museu do Índio do Rio de Janeiro, ela ampliou suas pesquisas na arte da miçanga, passando a produzir, além de sofisticados adornos corporais, séries de máscaras para instalações. Participaram ainda da exposição VaiVém (2019 – 2020), sobre as redes de dormir na cultura e arte brasileira, que circulou nos Centros Culturais do Banco do Brasil de São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, e realizaram sua primeira experiência curatorial no projeto Mundos Indígenas (2019 – 2022), ao organizarem a sala dedicada à arte Tikmũ’ũn, com o tema “yãy hã miy: transformar”, em cartaz no Espaço de Conhecimento da UFMG na capital mineira.

Visita virtual à sala Yãy hã miy: transformar na exposição Mundos Indígenas.

A Escola-Floresta e o movimento da Arte Indígena Contemporânea

No início de 2020, quando a crise da Covid-19 se instaurou, Sueli e Isael estavam preparando uma agenda intensa de projetos artísticos previstos para acontecer ao longo do ano. A necessidade de organizar a quarentena e acompanhar a atuação dos órgãos indigenistas nessa situação de emergência tornou-se imediatamente a prioridade do casal. Foi nessas circunstâncias que receberam, com entusiasmo, a indicação de Isael ao Prêmio Pipa [+]Trata-se de um dos principais prêmios para artistas contemporâneos no Brasil. O Prêmio Pipa possui duas categorias: a primeira se constitui pela escolha de um júri de especialistas, e a segunda, a categoria online, é uma votação aberta para o público. [-]. Essa importante janela de visibilidade que se abria para o seu trabalho foi incorporada às articulações políticas dos Tikmũ’ũn na defesa da saúde em suas comunidades, como ficou explícito nos trabalhos que Isael enviou para o Pipa em Casa, concurso emergencial organizado para auxílio de artistas durante a pandemia. A série de fotografias intitulada Yãmĩyxop yã ka’ok (Os yãmĩyxop são fortes) mostra algumas das ações organizadas junto aos yãmĩyxop para prevenção do contágio e garantia do bem-viver em Aldeia Verde: o fechamento das estradas de acesso à comunidade, o controle da circulação de pessoas e a organização de rituais de cura e fortalecimento da saúde. Como escreveu Isael no texto que acompanhou a série: “Antigamente, os brancos trouxeram doenças para as aldeias dos Tikmū’ūn, mas quando os antigos conheceram as doenças, eles fugiram para dentro da mata grande e se esconderam. Mas hoje onde iremos nos esconder? Por acaso sobrou alguma mata grande por aqui para nos escondermos? Hoje não temos mais espaço! Hoje só temos mesmo os nossos yãmĩyxop para nos proteger e nos fortalecer e soprar a doença para longe.”

Fica explícito, uma vez mais, como sua produção conecta as linguagens artísticas aos saberes tradicionais e à luta em defesa dos direitos indígenas – o artivismo Tikmũ’ũn alcançava, assim, uma das premiações mais importantes da arte contemporânea no Brasil.

Os meses que se seguiram foram muito turbulentos para o casal e seus parentes. A crise da Covid-19 fez sentir de modo ainda mais dramático o desmonte da política pública de saúde indígena, e intensificou também os assédios de missionários evangélicos. Tal conjuntura decompôs os arranjos políticos internos de Aldeia Verde, ocasionando a mudança de um grupo de mais de cem famílias e a criação de uma outra comunidade, a Aldeia Nova, onde Sueli e Isael passaram a viver desde junho deste ano.

Nesse espaço, às margens do rio Mucuri, um sonho antigo tornava-se tangível: a estruturação da Escola-Floresta. Trata-se de um projeto gestado por eles há muito tempo, que visa à formação de novos pajés e jovens-artistas, a recuperação ambiental da região e a soberania alimentar da comunidade por meio da organização de reuniões periódicas de pajés e a execução de oficinas de arte, cinema e agroecologia.

Essa iniciativa começou a ganhar corpo no processo mesmo de estruturação da comunidade recém-fundada: logo nas primeiras semanas de sua existência, enquanto finalizavam os mutirões para a construção das casas, organizaram o 1º Encontro de Pajés da Aldeia Nova, fomentando a troca de saberes entre especialistas da cultura Tikmũ’ũn e criando um contexto profícuo para as práticas de formação audiovisual.

Sueli filmando Isael durante o 1º Encontro de Pajés de Aldeia Nova, julho/2020

As notícias que nos enviavam, alternadas entre as dificuldades de constituir uma nova aldeia e o entusiasmo de viver perto do rio fortalecendo as práticas tradicionais, deram um vigor redobrado à campanha de Isael ao Prêmio Pipa Online. A campanha foi abraçada com entusiasmo por artistas reconhecidos da cena da arte indígena contemporânea e aliados, sobretudo diante das dificuldades do casal de acesso à internet na nova comunidade. A partir do mote #premiopipaterraindigena, viralizamos a participação de Isael no prêmio, entendida como um movimento estratégico para garantir recursos para as atividades iniciais da Escola-Floresta. Para difundir esse objetivo, destacar sua articulação com o movimento da arte indígena contemporânea [+]Para definições sobre o conceito de arte indígena contemporânea e sobre suas articulações enquanto um movimento de artistas, ver ESBELL, Jaider. Jaider Esbell. Coleção Tembetá. Rio de Janeiro: Azougue, 2019. [-] e convidar o público a votar em Isael Maxakali, organizamos uma série de lives apadrinhadas pelos artistas Jaider Esbell e Denilson Baniwa, vencedores de edições anteriores do prêmio. A programação de debates foi construída com Ailton Krenak, Arissana Pataxó, Daiara Tukano, Gustavo Caboco, Idjahure Kadiwéu, Maria Inês de Almeida, Naine Terena, Paula Gobetti e Rosângela de Tugny, aumentando o alcance da campanha, que terminou com a vitória de Isael com o maior número de votos na história do Prêmio Pipa.

A repercussão da campanha e da premiação de Isael convergem com a proposição de Jaider Esbell de que esta é a “década da arte indígena contemporânea”, ou seja, uma virada na longa história de apagamento e exclusão dos povos indígenas nas narrativas e instituições da arte ocidental.

Nas palavras da curadora Naine Terena, a arte indígena é a “arte da resistência” [+]TERENA, Naine. “Talk at the 2019 Verbier Art Summit, 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HEJ2CeOJYE4&t=4s [-]. Percursos como os de Sueli e Isael demonstram a profundidade dessa definição, uma vez que suas produções sempre fizeram parte de seus esforços de tradução entre mundos. Suas obras conectam a vitalidade estética e política dos modos de ser dos Tikmũ’ũn, ao mesmo tempo em que os transformam e reinventam, convidando os não-indígenas a se engajar em múltiplas formas de visão e escuta, a produzir alianças em prol do bem-viver do seu povo junto aos yãmĩyxop.

Ao nos deixarmos ser conduzidos pela força dos trabalhos de Sueli e Isael, o que apreendemos são outras modalidades de produção de arte, implicadas essencialmente com a vida, com a terra e com as forças vivas da floresta: arte-vida, arte-território, arte-resistência.

Paula Berbert

 

é antropóloga e programadora cultural. Faz doutorado no Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da USP, onde pesquisa o tema da arte indígena contemporânea.

Roberto Romero

 

é etnólogo, doutorando em Antropologia Social pelo Museu Nacional (UFRJ) e membro do Núcleo de Antropologia Simétrica (NanSi). É membro da Associação Filmes de Quintal e um dos organizadores do forumdoc.bh – festival do filme documentário e etnográfico de Belo Horizonte. Foi assistente de direção do longa “Yãmĩyhex: as mulheres-espírito” (Sueli e Isael Maxakali, 2019) e co-diretor do filme “Nūhū yãgmū yõg hãm: essa terra é nossa!” (Isael Maxakali, Sueli Maxakali, Carolina Canguçu, Roberto Romero, 2020). Foi assistente de curadoria da exposição Mundos Indígenas (Espaço do Conhecimento da UFMG).

Leia também