04 Mai 2020 |

Celso Adolfo ganha o Prêmio Flávio Henrique

O cantor, compositor e violonista venceu a premiação com o álbum Remanso de Rio Largo

Dedicado a valorizar trabalhos autorais de canção brasileira e de produção independente, de cantoras e cantores mineiros, a terceira edição do Prêmio Flávio Henrique elege o álbum Remanso de Rio Largo, do cantor, compositor e violonista Celso Adolfo.

O nome Remanso de Rio Largo é verso de uma canção cantada pelo personagem Siruiz na obra Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. O álbum de mesmo nome apresenta 16 músicas inspiradas no livro Sagarana, com histórias que saíram das páginas escritas por Rosa e voltaram na forma de música por Celso Adolfo.

O músico começou a compor o trabalho em abril de 2012, por ocasião da inauguração do Museu Sagarana, em Itaguara (MG), que foi criado para homenagear o escritor mineiro Guimarães Rosa. Após sete anos, em abril de 2019, Celso Adolfo lança Remanso de Rio Largo, com tiragem inédita de 3 mil exemplares. O álbum foi produzido por Celso em parceria com Robertinho Brant e conta com a participação de Leo Minax nos vocais.

Capa de Remanso de Rio Largo, de Celso Adolfo | Reprodução

Mineiro de São Domingos do Prata, Celso Adolfo iniciou a trajetória musical em 1983 com o LP Coração Brasileiro, produzido por Milton Nascimento. Remanso de Rio Largo é o nono trabalho solo da sua carreira.

“O reconhecimento renova os ânimos, e ter o meu nome ligado ao nome de Flávio Henrique, por esta premiação criada pelo BDMG Cultural, é uma honra muito diferente que experimento agora”, diz Celso Adolfo. O músico ainda salientou, “quando eu achava que o meu ano artístico de 2020 estava liquidado por causa do isolamento a que estamos submetidos (e que eu respeito integralmente), esta notícia me deu uma sacudida inacreditável. Ter ganhado o Prêmio Flávio Henrique, especialmente nas condições atuais, me ajudou (e como!) a ver que minha cabeça está fora d’água”.

Para o artista, a música mineira música é constantemente rica e muita variada. “Todos os gêneros são praticados entre nós. Pelo lado harmônico, é muito poderosa a imaginação dos nossos instrumentistas/compositores. Dos meus amigos que vêm lá dos 1970, Juarez Moreira é um guia que eu tenho, não para imitar, o que seria impossível, mas porque tem um amor ao violão que coincide com (e provoca) o meu”, completa Celso Adolfo.

Este ano, o Prêmio Flávio Henrique teve 13 trabalhos de canção inscritos e avaliação da cantora e compositora Déa Trancoso, do cantor e compositor Sérgio Santos e do jornalista João Paulo Cunha. A comissão de seleção comenta o Remanso de Rio Largo, de Celso Adolfo:

Déa Trancoso
Remanso de Rio Largo também poderia se chamar Dentro da Barriga de Minas Gerais, e, se lemos o texto corrido, veremos uma crônica única que narra o espírito flutuante das montanhas, os sertõezinhos móveis e impalpáveis que moram dentro do grande sertão, as veredinhas teimosas que insistem em ser o coração brasileiro. Celso lê os eus de um Brasil profundo e oriental como Béla Bartók lia a Hungria escondida nas vozes de suas matas. Vozes que só se dão a ver a determinados e raros vedores. Eu me lembrei de Paulo Mendes Campos e sua excelência quase musical em manejar as palavras. Eu me lembrei de Gilles Deleuze que sonhou reunir num só platô literatura, música e filosofia. Eis, pois. Eis Celso Adolfo, senhoras e senhores, a faquinha quicé que articula o sonho.

João Paulo Cunha
Com Remanso do Rio Largo Celso Adolfo compôs uma das trilhas possíveis da cultura mineira, que parte das histórias ou estórias de Guimarães Rosa reunidas em Sagarana, e deságua no rio que vai ganhando afluentes pelo caminho: a música, a poesia, pessoas reais e inventadas. A terceira margem. As 16 canções do álbum guardam referências diretas a versos recolhidos pelo escritor de Cordisburgo, espalhadas em seus contos como uma voz mítica que habita o mundo desde sempre. Celso Adolfo, com sofisticada artesania lírica e um ouvido rítmico impecável, transforma tudo em canção. Melodias que evocam as raízes populares, com um sopro do requintado barroco de seu violão quase viola, quase orquestra, se casam com graça com as palavras. O compositor reconta integralmente algumas histórias de Rosa com seu jeito próprio, destaca detalhes encantados de outras criações de Sagarana e, para completar, inventa personagens para habitar sua fantasia particular. O resultado é um disco que tangencia o maravilhoso.

Sérgio Santos
O CD Remanso do Rio Largo, de Celso Adolfo, é uma visita calorosa e imensamente criativa a Sagarana de João Guimarães Rosa. Penso cá comigo que se o Rosa recebesse a visita que há no disco, certamente receberia Celso com um café forte, e levaria à mesa aquele queijo do Serro que só se fatia em ocasiões especiais. Digo isso porque essa visita não é daquelas formalidades que beiram a obrigação. Ao contrário, é uma visita plena de intimidade, de prosa com sustança, dessas que não vê o tempo rolar. Visita de mineiro! Celso soube conjugar música e palavra com a maestria que vem dessa intimidade do café na mesa, que faz tempo ele alimenta com o universo mágico roseano. A sonoridade, a poética e a verve composicional estão fincadas na tradição, mas a renova pela originalidade, pela linguagem própria que Celso adquiriu com a árdua lida no ofício da canção. Celso Adolfo é um orgulho para Minas Gerais! Um expoente ímpar de sua geração!

Ouça o álbum


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