Cultivando raízes coletivas
As raízes são as responsáveis por manter as plantas firmes na terra, fornecendo-lhes nutrição e possibilitando seu crescimento. O processo de enraizamento é contínuo e leva tempo, simbolizando tanto uma permanência das plantas em um espaço como o movimento de troca perene com esse mesmo espaço e com os seres ao redor. O pensador mineiro Ailton Krenak nos convida a uma reflexão sobre a importância de cultivar saberes como cultivamos o solo, reconhecendo a importância de respeitar e aprender com os conhecimentos ancestrais, além de abraçar a fluidez e a troca de ideias em processos colaborativos de construção do conhecimento.
Começamos a elaboração desta edição da Revista BDMG Cultural quando ouvimos a história do trompetista Juventino Dias ainda no mês de maio, na abertura das apresentações da etapa final do 22º Prêmio BDMG Instrumental. Juventino falou sobre a presença da musicalidade afrodiaspórica alicerçada na tradição religiosa do Reinado e das bandas marciais em sua vida. Encantados, decidimos levar sua história para a capa da edição. No texto, o músico, compositor e educador, em conversa com Maria Luiza de Barros e Paula Lobato, reflete sobre sua trajetória em família, a manutenção das práticas culturais que vieram muito antes dele e, também, como essas práticas são traço fundante do que hoje apresenta ao público enquanto profissional.
Interessado em refletir sobre modos de manter vivas as tradições da cultura afromineira, e, mais ainda, em como lhes garantir reconhecimento diante de processos colonizadores que insistem em invisibilizá-las, o fotógrafo e pesquisador Vitú de Souza nos apresenta argumentos para identificar, na museologia ocidental, práticas e termos cujas origens podem ser traçadas a costumes e valores de culturas africanas e diaspóricas. A violência colonial é discutida também pela ativista e educadora Shirley Krenak, que, em depoimento exclusivo para a Revista BDMG Cultural, reforça o potencial da educação, da ação coletiva e do respeito à ancestralidade para as lutas ambientais, indígenas e feministas.
Pensando em estratégias para manutenção, registro e troca de saberes, a professora Luciana de Oliveira compartilha, em uma entrevista, as formas como vem experimentando a desconstrução dos meios de comunicação enquanto veículos coloniais e os transformando em formas inventivas de compartilhamento entre mundos a partir de trabalhos colaborativos com intelectuais indígenas e quilombolas. E a arquiteta e pesquisadora Priscila Musa escreve um relato sobre a construção de um método para ver, pensar e, usando um termo que cunhou, transvisualisar os arquivos fotográficos da cidade de Belo Horizonte como forma de revelar histórias que não podem ser encontradas nos livros.
Cultivando raízes coletivas é uma edição especial para nós, da equipe do BDMG Cultural, pois celebra os primeiros 10 conjuntos de textos organizados na busca por conhecer, registrar e publicar Histórias contemporâneas da cultura em Minas Gerais. É com muita alegria que convidamos os leitores e leitoras a revisitar nossas próprias raízes e se inspirar com cada uma das edições anteriores. Seguimos acreditando na importância de amplificar o alcance das múltiplas vozes que compõem nossas Minas e nossas Gerais, dos saberes tradicionais e ancestrais que, como ensina Ailton Krenak, são a chave para enfrentar os desafios contemporâneos.
Expediente
Edição de textos: Igor Lage
Textos e colaborações: Juventino Dias, Maria Luiza de Barros, Paula Lobato, Vitú de Souza, Shirley Krenak, Igor Lage, Luciana de Oliveira, Felipe Carnevalli e Priscila Musa
Projeto gráfico: Estúdio Guayabo
Diagramação: Paulo Proença e Maria T Morais